Além das pedras do cais
Em julho de 2021 o Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais lançou um edital (Edital de Ensino 08/2021) para selecionar projetos de ensino voltados às ações afirmativas. Assim nasceu “Saravá, referências pretas!”, uma newsletter mensal sobre questões étnico-raciais, com ênfase na população negra.
A proposta consiste em abordar não apenas as chagas deixadas pelas diferentes estruturas do racismo que atravessam essas pessoas, mas também apresentar conteúdos que valorizem outras dimensões de suas vivências.
A equipe é formada pelos estudantes Carlos Henrique Passos de Oliveira (2º ano do Curso Técnico em Informática integrado ao Ensino Médio) e Lucca Kennedy da Silva (3º ano do Curso Técnico em Agroecologia integrado ao Ensino Médio), sob orientação dos professores Higor Mozart Geraldo Santos (Geografia) e Weder Ferreira da Silva (História), todos vinculados ao campus Muriaé do IF Sudeste MG.
Aproveitamos para contar que nosso logotipo, que você vê ali acima, foi criado a partir da fusão das letras s e a, de forma a evocar o Sankofa; símbolo africano que significa “Voltar para buscá-lo”, representando, portanto, a importância da aprendizagem com o passado.
Para ler mais sobre esse e outros símbolos africanos, recomendamos o livro"História da África nos Anos iniciais do Ensino fundamental: os andinkra" de Eliane do Carmo, que pode ser acessado ao clicar no link acima.
Além das Pedras dos Cais
Na famosa canção O Mestre Sala dos Mares, os compositores João Bosco e Aldir Blanc narram a história de João Cândido, o marinheiro negro que se insurgiu contra os castigos físicos impostos aos marujos pela marinha brasileira no início do século XX. Pelo seu teor político, a canção foi censurada pela ditadura militar e, quando lançada em 1974, teve trechos alterados. Ao término da canção, imortalizada na voz de Elis Regina, o cancioneiro popular conclui em tom de denúncia: “Salve o navegante negro/Que tem por monumento as pedras pisadas do cais”. Os compositores denunciavam em seus versos que mesmo um verdadeiro herói nacional não estava representado em uma estátua ou monumento. Seus feitos tinham como testemunhas apenas as pedras do cais da Praça XV, localizada no centro do Rio de Janeiro, antiga capital da República.
Recentemente, protestos no Brasil e no mundo ganharam as ruas e colocam em voga a questão da falta de representatividade da população negra e indígena em monumentos e estátuas públicas. Várias estátuas erigidas ao longo dos tempos passaram a ser depredadas ou mesmo retiradas de locais públicos, uma vez que as personagens a quem elas homenageiam, sejam eles invasores europeus ou bandeirantes, estão associados a processos históricos que resultaram na escravidão e no extermínio de milhões de negros e indígenas.
O assunto é dos mais polêmicos. O que fazer com tais monumentos? Devem ser simplesmente depredados para que as infames personagens desapareçam para sempre da memória social ou postos em museus, a fim de que as pessoas possam conhecer o passado de violência do qual tais personagens se associam?
É exatamente neste polêmico tema que envolve a questão da representatividade negra em torno das estátuas e monumentos no mundo contemporâneo que o Projeto de Ensino Saravá, referências pretas! dá início aos seus trabalhos. Nosso objetivo é levar ao leitor temas relativos às questões étnico-raciais em voga na sociedade brasileira. Neste primeiro número, selecionamos cuidadosamente uma série de reportagens sobre as polêmicas e as novas perspectivas em torno dos monumentos públicos, cuja construção, longe de serem triviais, pretendem perpetuar certas imagens do passado. Tais imagens, no entanto, têm sido confrontadas tanto por pesquisadores quanto pela opinião pública. Foi exatamente neste contexto de renovação que em 2008 inaugurou-se uma estátua em bronze de João Cândido, juntando-se às pedras pisadas do cais da Praça XV para assim ajudar a contar a história do almirante negro. Mais recentemente, para ganhar mais visibilidade, monumento foi transferido para a Praça Marechal Âncora.
Boa leitura!
Estátua do Almirante Negro na Praça Marechal Âncora - Rafael Catarcione/Prefeitura do Rio
Links sobre o assunto:
✭ Inscrição espacial do racismo e do antirracismo: a 'Pequena África' como forma espacial de descolonização da área central e portuária do Rio de Janeiro, por Denilson Araújo de Oliveira
✭ Podem os monumentos falar? - Mais do que derrubar as estátuas de escravagistas e colonizadores, é fundamental uma agenda de política da memória nas cidades brasileiras, por Fillipe Alves
✭ Como mito de estátuas gregas brancas alimentou falsa ideia de superioridade europeia, por Elisa Kriezis
✭ Livro digital para download: João Cândido: o mestre sala dos mares
✭ O mar como palco de luta, episódio do podcast Vidas Negras dedicado a Chico da Matilde (conhecido como Dragão do Mar), líder da greve dos jangadeiros, e a João Cândido (o Almirante Negro), líder da Revolta da Chibata.
✭ Estátuas, monumentos e suas derrubadas | Nerdologia:
✭ Frantz Fanon nos estudos geográficos patrimoniais - Geny Ferreira Guimarães
✭ A guerra às estátuas e a política pública de memória - Marcos Napolitano
✭ Protestos do Chile questionam história oficial das estátuas, por Rocío Montes
✭ Spike Lee, George Floyd e a Derrubada de Monumentos
✭ Racismo e estátuas - Xadrez Verbal Podcast
✭ Sequência didática - Os Indígenas e os Bandeirantes, Reescrevendo a história convencional , por Renata Garcia Cruz
✭ Rolê Urbano – Episódio #25 – Derrubando Estátuas
✭Estátua de mulher indígena substituirá a de Colombo na Cidade do México...
✭ ‘A Jovem de Amajac’, a história da escultura que substituirá a de Cristóvão Colombo no México, por Beatriz Guillén
Por falar em estátuas, lembramos desta que você vê abaixo:
Trata-se de homenagem feita, no Largo de São Francisco da Prainha, no bairro da Saúde (Rio de Janeiro), em 2016, à Mercedes Baptista, primeira bailarina negra a participar do corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, tida como “a maior precursora do Balé e da Dança Afro no Brasil”.
Você pode conhecer um pouco mais sobre sua trajetória a partir do projeto Letras Pretas, da UERJ, que dedicou um episódio a ela. São seis minutinhos. Ouve aí : )
Algumas outras produções dedicadas a essa importante bailarina estão no Ciência & Letra, no Especial Mercedes Baptista, no podcast Negra Voz, no Mulheres Admiráveis e no documentário Balé de Pé no Chão - a dança afro de Mercedes Baptista.
Saravá, Mercedes Baptista!
Mas além da estátua de Mercedes Baptista, quantas outras, de pessoas negras e indígenas, conhecemos? Quantas delas são de mulheres? Quais são as estátuas presentes nos caminhos por onde você passa?
No caso da cidade de São Paulo, estima-se que “menos de 3% de estátuas representem negros ou indígenas”. Estas pouquíssimas estátuas devem ganhar a companhia de 5 personalidades negras, são elas: Carolina Maria de Jesus, Geraldo Filme, Adhemar Ferreira da Silva, Madrinha Eunice e Itamar Assumpção. Ao clicar no link anterior você pode conhecer um pouco mais sobre cada uma dessas pessoas.
Dia dos professores e professoras
Aproveitamos a data do último dia 15 de outubro para prestar nossas homenagens aos(às) docentes e relembrar dela ali acima, Antonieta de Barros: professora , oradora, escritora, jornalista, militante e primeira deputada estadual negra*** do Brasil, que encampou destacada luta pela educação e direitos das mulheres e negros. Ah, além disso, entre feitos outros, ela foi responsável pela lei que oficializou o dia 15 de outubro como dia dos professores!
***Você reparou que só nessas curtas linhas, falamos da primeira bailarina negra a participar do corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e da primeira deputada estadual negra do Brasil? Primeira…Primeira…Anos depois dos feitos dessas mulheres pioneiras, quantas são as bailarinas e políticas negras que ocupam certos espaços? Anos depois, quantas vezes os(as) negros(as) ainda serão as excessões em certos lugares?
Para ler mais sobre Antonieta, separamos para você o verbete do Literafro - o portal da literatura afro-brasileira: http://www.letras.ufmg.br/literafro/autoras/57-antonieta-de-barros
Saravá, Antonieta!
Esse assunto nos relembra a campanha institucional realizada, em 2016, pela Universidade Federal de Juiz de Fora que trouxe à tona a seguinte pergunta:
✭ Campanha “Quantos professores negros você tem?” (#nãoécoincidência)
✭ Quantos(as) professores(as) negros(as) você já teve?
#Se liga: Eventos e Cursos
Agora em outubro o projeto de extensão “Cultura e Consciência Afro-Brasileira e Indígena na sala de aula e para a vida” realizará o “Curso on-line "História, Cultura e Mobilizações Indígenas na sala de aula" (40h). A partir de uma parceria estabelecida com o Sindicato dos Professores de Juiz de Fora (SINPRO JF) e com a Regional Leste do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), foram disponibilizadas 100 vagas para docentes de escolas públicas e particulares de Juiz de Fora. As inscrições podem ser realizadas até o dia 21 de outubro através do seguinte link: https://forms.gle/obxqNE8txqd8PfXX9
De acordo com o coordenador do projeto, o professor Luís Eduardo de Oliveira, “no dia 22 de outubro, sexta-feira, entre 16:00h e 18:00h, acontecerá o 1º encontro do curso, com o tema “Indígenas na formação social brasileira entre os séculos XVI e XIX” e a participação da bióloga Cleonice Pankararu (Toá Kãnynã Pankararu), líder indigena da Aldeia Cinta Vermelha-Jundiba (Araçuaí - MG) e da professora Martha Victor Vieira, do Departamento de História da Universidade Federal do Tocantins (UFT)”.
O projeto “Cultura e Consciência Afro-Brasileira e Indígena na sala de aula e para a vida”, além do Prof. Luís Eduardo de Oliveira - Núcleo de História / Campus Juiz de Fora do IF Sudeste MG, conta com os seguintes integrantes: Prof. Antonio Gasparetto Júnior - Bolsista Colaborador Externo; Prof.ª Helena Azevedo Paulo de Almeida - Colaboradora Voluntária; Ana Luisa de Almeida Nascimento - Bolsista do Ensino Médio; Iasmim Policarpo Dias - Bolsista do Ensino Médio
Clube de Leitura on-line: Em contos com a Literatura Afro-brasileira e alunos do campus Santos Dumont
“Imaginação, encantamento, empatia, crítica social, representatividade, uma melhor compreensão do mundo e de suas dinâmicas ou mesmo a oportunidade de uma boa conversa. Diversas razões nos convidam à leitura e vários caminhos nos levam à nova fase do Clube de Leitura on-line da Biblioteca Acyr Loureiro Lima, do Campus Santos Dumont do Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais (IF Sudeste MG). O clube é aberto a todas as pessoas e trará, de outubro deste ano até fevereiro de 2022, a leitura e o debate de nove contos da Literatura Afro-Brasileira. Para participar, basta acessar o grupo no WhatsApp em bit.ly/clubedeleiturasd” (Clube de Leitura on-line: Em contos com a Literatura Afro-brasileira e alunos do campus Santos Dumont/Divulgação)
O O Clube de Leitura on-line foca em contos da Literatura Afro-brasileira e conta com coordenação e participação de: Paula Souza da Silva; Érica Veloso Pimentel de Mello; Abel Ribeiro Fortes. Na nossa próxima edição de nossa newsletter divulgaremos os demais encontros.
O Mapa da Violência Contra Jovens Mulheres Negras e Pardas
A primeira oficina do projeto “Jovens Mulheres Negras: Despertar na Pandemia contra o Feminicídio" do IF Sudeste MG (São João del-Rei) será realizada no dia 26/10. Para acompanhar basta clicar aqui.
O projeto “Jovens Mulheres Negras: Despertar na Pandemia contra o Feminicídio" é orientado/coordenado pela professora Alessandra Furtado Fernandes e tem os seguintes Co-Orientadores: Carla F. Gouvêa Lopes, Bernadete Malta Barroso, Igor Cerri, Juliana Rodrigues de Almeida. A bolsista é a estudante Janaina Nasare da Silva.
V Encontro de Relações Raciais e Sociedade (ERAS):
Com o subtítulo “Eles combinaram de nos matar: raça, gênero e classe e o extermínio das populações negra e indígena no Brasil pandêmico” e promovido pelo pelo NEABI do IF Sudeste MG-Campus São João del-Rei, será realizado nos dias 09 e 10 de novembro o Encontro de Relações Raciais e Sociedade (ERAS) que nessa quinta edição “propõe um amplo debate acerca das vivências interseccionais de raça, gênero e classe no Brasil pandêmico, com destaque para os desafios enfrentados pelas populações negra e indígena. Para tanto, o tema do evento ecoa as vozes dos escritores Conceição Evaristo e Ailton Krenak”. (Fonte: DivulgaçãoV Encontro de Relações Raciais e Sociedade (ERAS/IF Sudeste-Campus São João del-Rei)
Mais informações e inscrições: https://www.even3.com.br/eras2021/
IV Arvorecer Negro - 2021
O evento, que tem como subtítulo "A internet como palco de luta: Ciberativismo negro e as disputas do mundo virtual à rua”, é organizado pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas do Instituto Federal Baiano (Campus Teixeira de Freitas) e será realizado de 8 a 11 de novembro. As inscrições são gratuitas: https://www.even3.com.br/ivarvorecernegro_2021/
VI Encontro Nacional dos Neabs, Neabis e Grupos Correlatos da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica - ENNEABI
Mais informações: https://doity.com.br/vi-enneabi-2021
Na próxima edição (novembro) vamos falar de atividades de ensino, pesquisa ou extensão focados em questões raciais. Se você quiser nos ajudar falando um pouco do seu projeto, preencha, por favor, esse formulário: https://forms.gle/tHcwoBvjaKNnhb6H8
Ah, como nunca te pedimos nada: compartilhe com todo mundo. Vai, por favor!
Para dúvidas, críticas, sugestões: saravareferenciaspretas@gmail.com
Valeu, nos vemos na próxima edição! : )
Agradecemos à Alessandra Furtado Fernandes, Paula Souza da Silva, Érica Veloso Pimentel de Mello e Luís Eduardo de Oliveira pelas informações relacionados aos projetos em que estão envolvidos.
Fontes das imagens utilizadas: Andrevruas; Inventario dos Monumentos (RJ); Arquivo Nacional; O Globo; Projeto “Jovens Mulheres Negras: Despertar na Pandemia contra o Feminicídio" (IF Sudeste MG); projeto de extensão “Cultura e Consciência Afro-Brasileira e Indígena na sala de aula e para a vida”(IF Sudeste MG); Literafro; Diretoria de Comunicação/UFJF/Divulgação; IV Arvorecer Negro - 2021; Clube de Leitura on-line: Em contos com a Literatura Afro-brasileira e alunos do campus Santos Dumont; V Encontro de Relações Raciais e Sociedade (ERAS)
Créditos
Equipe: Carlos Henrique Passos de Oliveira; Lucca Kennedy da Silva; Higor Mozart G. Santos e Weder Ferreira.
Financiamento: Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais | Projetos de Ensino - Ações Afirmativas - Edital 08/2021.
Coordenação: Higor Mozart G. Santos
Que incrível!!!
Projetos como esse, que disseminam informações relevantes e necessárias de forma responsável e verdadeira, são mais que necessários para valorização e enriquecimento da cultura negra !!!👏🏻
Parabéns aos professores Weder e Higor, bem como aos demais da equipe!!!
Muito legal este projeto parabéns prof. Higor e equipe